domingo, 12 de setembro de 2010

No hospital...[25]



Os dias que se seguiram foi como “um nascer de novo”, tive que me adaptar a tantas coisas. A primeira, o estar ali quase imóvel cheia de tubos, o ter que abrandar os meus pensamentos, e a descoberta de que as coisas podem esperar.
Depois foram todas as pessoas que por ali foram passando. Os meus “sócios”, o Jorge e o Afonso estiveram, abraçaram-me com tanto carinho, choraram e iam fazendo projecções para o futuro, depois ríamos, porque eles queriam fazer “obras” no quarto do hospital. Eu pessoalmente não, antes queria ir embora dali, aquele ambiente ponha-me doente. O Paulo também veio acompanhado de um guarda e da Maria, mas pediu para ficar a sós comigo, eu acenei com a cabeça para a enfermeira:
- Yara! Sabia que não te ia perder, pedi-Lhe tanto por ti. Pedi-Lhe até que me levasse a mim e não a ti. Não consegui dormir, nas noites que te sabia em “parte incerta”, mas agora estás aqui.
- Pois estou! Voltei! Mas, olha que do outro lado também se está bem, gostei tanto de estar lá...
- Compreendo, mas fazes falta aqui.
E abraçou-me como se o mundo tivesse acabado. O Paulo chorava, e eu tomei coragem e disse-lhe:
- Paulo, diz-me uma coisa, mas tens que ser muito sincero.
- Sim, querida, diz.
- Olha, para mim, o que vês?
- Queres que seja sincero, ou queres que te diga o que tu queres ouvir?
- Sê sincero...
- Ante os meus olhos está a mulher que eu amo, cada dia que passo essa é cada vez mais a certeza do meu viver, contigo Yara ia até ao fim do mundo!
- Mas...
- Eu sei Yara...respeito-te, mas tinha que te dizer e fui sincero, o mais possível.
Não era nada disso que eu queria, eu queria que o Paulo me falasse do meu rosto, porque é que não falava...talvez não fosse assim tão grave.
- E o Álvaro, como está?
- Não está bem, Yara, talvez não se salve, continua com diagnóstico muito reservado.
- Óh, não! Lamento Paulo.
- Pois, eu também, é meu pai; mas, sabes que nunca tivemos muita afinidade, o meu pai sempre foi o senhor durão, braço de ferro, embora tenha mudado, essa mudança já não me conseguiu atingir muito, sofri muito por causa dele, no entanto, claro que quero muito que ele fique bem. Agora tenho de ir, mas sabes que estás no meu coração.
Despedimo-nos, o Paulo era amoroso e tratava-me como se eu fosse um bibelô, agora ainda mais, e amava-me de um jeito que me marcava, mas eu apenas sentia uma grande amizade por ele, ás vezes o meu coração vacilava, mas logo vinha a certeza dos meus sentimentos.
O Miguel, o jovem pintor também me visitou e trazia consigo um embrulho enorme, era o meu quadro - Yara - foi ele que o desembrulhou, pois eu não conseguia, e à vista do mar, do meu mar, umas lágrimas iam rolando pelo meu rosto:
- Obrigado Miguel por esta surpresa, está realmente lindo, posso até ouvir o barulho das ondas e sentir o cheiro a maresia.
- Ainda bem que gostaste! Aproveito também para te deixar a chave do teu carro, que o mecânico deixou comigo, lembras?
- Ah! Sim, agora lembro o meu carro, o rapaz ficou de me entregar naquela tarde... Obrigado Miguel!
- E põe-te boa depressa, tenho sentido a tua falta por lá!

As visitas iam ocorrendo entre momentos de descanso, sentia-me cansada e adormecia facilmente, mas quando acordava sentia-me cheia de força e uma vontade enorme de sair dali e correr á beira mar, sentir os pés na areia e o voo das gaivotas, e ficava olhando o quarto branco, e o quadro do Miguel, que, não me recordava o mar, mas que era o mar, tal como o havia visto naquela manhã.
Estando eu entregue a estas meditações, vejo entrar um enfermeiro que se abeira de mim:
- Yara! Não quis ser dos primeiros, queria que te ambientasses, que sossegasses, mas estou muito feliz por teres voltado e foi penoso para mim esperar ...mas, agora estou aqui!
E abraçou-me com tanta força, que eu quase perdi a possibilidade de respirar, quem me abraçava assim, daquele modo,? Não me conseguia situar, fazia um esforço enorme para recordar, mas não conseguia...E eu permanecia em silêncio, algo alheia a tanto sentimento. Depois do forte abraço, beijou-me na testa, e continuou:
- Yara, o amor permanece, e a distância dos anos não o fez perder-se, pelo contrário aumentou, revisitei-o em cada ida á “nossa rocha”...
- Jorge, que bom ver-te de novo, mas agora cresci e o amor não faz parte dos meus planos, quero ser feliz e não é por aí.
- Continuas a ser a minha menina! E eu vou continuar a cuidar de ti!
E saiu, como que ignorando as minhas palavras, e eu sorri, continuava o mesmo de há tantos anos atrás...

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