sábado, 11 de setembro de 2010

O Acordar... [24]




Um cheiro forte me invadiu. Sentia dores, abri os olhos e vi uma sala branca, o sol entrava pela janela e ao fundo a minha mãe lia um livro. Eu estava cheia de tubos, nos braços, no nariz, mas que era isto? Eu estava no hospital, sim o cheiro era de hospital, ó não! Timidamente chamei a minha mãe:
- Mãe…
- Yara! Acordaste querida! Estás bem?
- Não, antes estava muito melhor, agora estou cheia de dores e por favor tirem-me já estes tubos, preciso de sair daqui rapidamente, tenho imensa coisas para fazer.
- Calma Yara. As coisas não são assim, acabas de acordar de coma e isso é maravilhoso, tem calma agora.
- Coma?
E como era isso? O que aconteceu?
- Sim, Yara tiveste um acidente de carro, recordas? Com o Dr.Álvaro, ele também não está nada bem…
- Ah…, sim, lembro-me vagamente, não do acidente, mas do Álvaro…e o Paulo? Como está o Paulo? Ai, Meu Deus! Eu tenho uma responsabilidade para com o Paulo, preciso ir á prisão já!
- Não Yara, não vais à prisão, descansa e sossega, por favor, o Paulo virá ver-te, penso eu…mas acalma-te, vou chamar a enfermeira.
- Não, espera. Preciso do meu silêncio, não quero falar com ninguém agora, sinto-me confusa, aqui há muito barulho…
- Barulho? Mas, está tudo em silêncio, o que ouves, são apenas as nossas vozes, quase em surdina.
- Mas, onde eu estava havia um silêncio azul, imperturbável…Preciso de me adaptar, a sério, não chames ninguém, e se aparecer, finge que não se passou nada, agora vai continuar a ler o teu livro…
- Yara, não sei se é boa ideia…
- Mãe! Confia em mim, preciso do meu silêncio agora, só um pouco…
A minha mãe cedeu, e eu tentei serenar, mas, apesar de não se ouvir absolutamente nada, o silêncio já não era o mesmo, onde estava o meu silêncio? Aquele que me invadia? Queria voltar lá, mas já não conseguia, as dores no corpo eram insuportáveis, via mal, tinha comichão no rosto, parecia haver crostas, não entendia...
Fiquei assim algum tempo, tentando ambientar-me, mas cada vez estava mais confusa, voltei a chamar a minha mãe:
- Mãe! De facto é melhor chamar a enfermeira, estou cheia de dores. Ah! E já agora diz-me o que tenho no rosto, sinto uma comichão terrível e…
- Cuidado, não toques…
- Não? Então?
- Ai! Filha é uma sorte estares viva, cheguei a pensar que partias…
- Mas, eu não perguntei isso, falávamos sobre o meu rosto…
E nesse momento bateram à porta e abriram, era uma enfermeira…
- Ai que alegria, então a nossa Yara já voltou? Fico muito feliz, como te sentes, amiga?
- Tenho muitas dores, antes não tinha…
- Está descansada que vamos já tratar disso! Ai, o Jorge vai ficar felicíssimo, ele foi só a casa tomar um duche, e volta de seguida.
- Jorge… quem é?
- Não te lembras do Jorgel? Olha que ele nestes dias ficou sempre por aqui no hospital, parecia o teu pai, ele adora-te menina! Mas, não te vou contar mais nada, faz um esforço para te lembrares, tá? Agora vamos tratar da medicação.
- Sim, está bem? E acha que tenho que ficar aqui muito tempo? E sabe uma coisa…tenho fome, apetece-me comer.
- Nada disso, não podes comer por enquanto, o Dr. é que vai dizer todas essas coisas que queres saber, ok? Vou já avisa-lo do teu regresso!
- Só mais uma coisa…vejo mal e o meu rosto esta estranho…
- Sim Yara! Sofreste um traumatismo craniano, e o teu rosto foi suturado, está inchado e negro, mas não te preocupes, tudo isso vai passar.
Entendi, o meu rosto devia estar horrível, cheio de linhas pretas, meu Deus e onde agora estavam as linhas a seguir iriam ficar cicatrizes, senti uma tristeza enorme nesse momento, queria ver o meu rosto, mas ao mesmo tempo não queria. Tentei tranquilizar-me, lembrei das palavras da minha mãe quando lhe perguntei sobre o meu rosto - Ai! Filha é uma sorte estares viva, cheguei a pensar que partias… - e agradecia a Deus estar viva e pedi-Lhe baixinho para não estar assim tão desfigurada como eu estava a imaginar…

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